terça-feira, 2 de abril de 2013

Depositantes do Banco do Chipre terão 60% das economias congeladas

O Banco Central do Chipre divulgou no último domingo (31/03) uma lista de perguntas e respostas sobre o nebuloso processo de taxação de depósitos bancários, imposto pela troika (Comissão Europeia, Banco Central Europeu e FMI), aos detentores de mais de 100 mil euros em saldo. Segundo a instituição, os depositantes terão até 60% de suas economias congeladas ou transformadas em ações do Banco do Chipre, o maior do país.
A inédita engenharia financeira, aprovada pelo Eurogrupo, formado pelos 17 ministros das finanças da zona do euro, não precisa passar pelo Parlamento cipriota e é causa da ira de correntistas da ilha, entre eles cidadãos russos que detêm cerca de um terço do dinheiro parado no país. O objetivo da taxação é recapitalizar o Banco do Chipre e abrir caminho para a entrada do FMI na ilha com um empréstimo de 10 bilhões de euros (cerca de R$ 26 bilhões).
De acordo com o Banco Central do Chipre, os depósitos acima de 100 mil euros terão uma fatia de 37,5% “automaticamente convertida em ações classe A do Banco do Chipre, com direito a voto e lucro”. Outra fatia, de 22,5%, será “congelada temporariamente e parte, ou o valor total, será convertida em ações do banco com direito a voto e lucro para o resgate do banco.” Não há garantias sobre retorno financeiro das conversões.
A Comissão Europeia, composta pelos ministros de Finanças da zona do euro, afirmou na semana passada que o controle de capitais na Chipre - limites de saques, de transferências e de uso de cartão de crédito no exterior, entre outras medidas - deverá durar até a próxima quarta-feira (04/04). A bolsa de valores do país voltaria a operar nesta segunda-feira (01/04).
O presidente da ilha mediterrânea, Nicos Anastasiades, do Partido Conservador, agradeceu a “maturidade” dos cipriotas por não terem causado tumultos nos bancos do país, que abriram após duas semanas de portas cerradas. Ao mesmo tempo, seus familiares são acusados de enviar 21 milhões de euros para Londres dias antes de acordar o congelamento de taxação de depósitos no país.
‘Solução’ estava na mesa
As declarações da Comissão Europeia e de Anastasiades, que desenham um aparente sucesso na aplicação de medidas impopulares no Chipre, restringindo a movimentação financeira, escondem um clima de grande incerteza sobre os rumos da zona do euro. A entrevista do chefe do Eurogrupo, Jeroen Dijsselbloem, que cravou a intervenção financeira no Chipre como um “modelo” para futuros “resgates” - envolvendo a taxação de depósitos bancários - causou um forte eco negativo nos mercados e precisou ser abrandada posteriormente, em nota oficial.

O ministro das Finanças da Alemanha, Wolfgang Schäuble, também se apressou a por panos quentes sobre o que dissera Dijsselbloem, mas na sexta-feira (29/03), em meio ao vaivém declaratório sobre o sistema financeiro cipriota, um membro do alto escalão do BCE (Banco Central Europeu) fez reviver o temor dos mercados. Mais do que isso, disse que a solução encontrada para o Chipre é algo considerado pela troika há tempos.
“O conteúdo de suas declarações [de Dijsselbloem] refletem a abordagem que esteve na mesa há um bom tempo na Europa. Essa abordagem será parte da política de liquidação europeia”, afirmou Klaas Knot, do conselho do BCE ao jornal holandês Het Financieele Dagblad. Surgiram então informações de que o mesmo tipo de “resgate” foi considerado para a Grécia, hoje com os piores índices econômicos da zona do euro.
Com a afirmação, o conselheiro do BCE deixa na ponta dos pés países com o mesmo perfil do Chipre, como Malta e Luxemburgo, paraísos fiscais que sobrevivem à custa do mercado financeiro, e expõe um caminho que vai contra o artigo 1º da Convenção Europeia de Direitos Humanos, que versa sobre o direito à propriedade. Analistas avaliam que ao impor um bloqueio aos depósitos bancários, a convenção está sendo gravemente ferida.
Fonte: Ana Carolina Marques/Opera Mundi